9.8.24

Morada desconhecida (fábrica dos sonhos)

Sons of Kemet, “Play Mass”, in https://www.youtube.com/watch?v=BPFRBTS39Vo

Ninguém sabe onde fica a fábrica dos sonhos. Ninguém sabe se alguém procurou saber onde são fabricados os sonhos. Importa descobrir a morada dos sonhos? Se alguém soubesse e não escondesse o segredo, os sonhos eram diferentes?

Faça-se de conta que as pessoas descobriam a sede dos sonhos e acorriam às instalações onde os sonhos são congeminados. Ao entrarem no edifício, a sua intenção seria tomar conta do processo dos sonhos para os tornarem compatíveis com os seus desejos e preferências? As pessoas têm a certeza que queriam adulterar os sonhos? Teriam a noção de como estariam a colonizar os sonhos e eles deixariam de estar fora do perímetro da sua vontade? Acorrentar os sonhos à vontade das pessoas é como liquidar os sonhos, que deixariam de ter esse nome.

Os sonhos podem ser corpos estranhos que inquietam as pessoas que são assaltadas por eles. A sua reação hostil aos sonhos que se transfiguram em pesadelos é o aval para o desejo inconfessável de serem os reguladores dos seus próprios sonhos. Assim como assim, as pessoas vão sendo instruídas numa cidadania que as atira para o regaço de uma proteção paternalista; desabituaram-se do livre-arbítrio e de terçarem os seus recursos quando são incomodadas por adversidades. 

Ou então, a descoberta da fábrica dos sonhos ia ao encontro de motivos lúdicos, a incorrigível curiosidade de perceber as estruturas e os mecanismos que, de outro modo, ficam imersos numa água baça que impede o entendimento. Esta curiosidade seria o incentivo para descobrir a morada dos sonhos. 

As pessoas não querem saber dos sonhos antes de eles terem lugar. Não querem interpretá-los a destempo, como se a sua decifração servisse para os travar. Muito menos seria sua intenção entrar no processo interno dos sonhos para serem autoras dos seus próprios sonhos. Porque perceberam que compensa haver domínios que estão fora da sua alçada. 

O acaso é um risco que aceitam para contrariar a pureza do princípio geral da previsibilidade que os torna domáveis a quem de (des)direito.

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