Haia Rani ft. Patrick Watson, “Dancing with Ghosts”, in https://www.youtube.com/watch?v=tP97_AQCldk
Não se esqueçam da mitologia herdada de lustros anteriores: a condição de herói não é para qualquer um, só está ao alcance dos predestinados ou dos que se despem de si mesmos para darem a vida por outros ou por uma causa. O avanço da modernidade foi curando a doença do heroísmo. Outros ismos vieram a terreiro, mais populares e venais: o hedonismo, o individualismo, a rejeição do perfecionismo. Tal como as pessoas andam arredias dos lugares de culto (prova: apreciar a saída da missa e tentar apurar a idade média dos utentes; se o envelhecimento não for substituído por novas gerações, a crise da fé será ainda mais dolorosa), as pessoas fogem da bravata típica dos heróis. Declinam a hipótese de figurarem na galeria dos heróis que deixaram de existir porque decidiram ser heróis. O efémero que comanda o compasso do tempo moderno não se compadece com o desejo dos que se alistam no exército dos potenciais sacrificados em nome dos outros. Os mais jovens não se importam que os outros sejam heróis na sua vez. Pese embora um almirante com aspirações políticas ter resgatado, da sala mortuária onde jazem os comportamento de antanho, a palavra hierárquica que convoca a obediência acrítica, a linguagem castrense e a pose grave de candidato a estadista que promove o arregimentar de futuros apedeutas prontos a serem a próxima carne para canhão (agora que a guerra está mais na moda e o almirante acredita piamente que tropas lusas farão a diferença nos conflitos futuros). Talvez o almirante possa oferecer a autoria de um manual de instruções para os candidatos a herói aprenderem o que lhes falta para serem heróis. À falta de ocasiões, podem ir treinando. Em efabulações coletivas à volta de uma mesa onde jogam às cartas, bebericando minis fresquinhas e ouvindo as mentiras que os superiores, tão superlativos, contam de si mesmos.
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