1.8.24

Quem ficou em último lugar? (Olimpíadas do avesso)

Yves Tumor, “Heaven Surround Us Like a Hood”, in https://www.youtube.com/watch?v=tsOi9znJmEo

Aquele, moído, bordão: dos fracos não reza a História. Nos certames internacionais onde os atletas competem pela glória, por medalhas, prémios rendosos e valiosos contratos publicitários (não necessariamente por esta ordem), os fracos não passam de figurantes. Seus são os nomes que servem de ornamento às tabelas estatísticas dos certames que ficam a pender para memória futura. Nomes que ninguém lembrará. 

Como figurantes, deviam, assim mesmo, animar a atenção dos que dedicam atenção a estas competições periódicas. Quem daria importância a uma competição se a ela acorressem apenas meia dúzia de ases? Ter uma frequência numerosa engrandece as proezas dos que arrebatam as medalhas: foram esses que se distinguiram entre os demais, os muitos demais. Para se tirar esta conclusão, não se pode esquecer que sem os demais a conclusão seria invalidada. Não atingiriam tanta celebridade os medalhados se a proeza desportiva não fosse elogiada por ter sido obtida entre um acanhado contingente de concorrentes.

Nos vários desportos a concurso, há os favoritos e os outros. Mesmo não sendo favoritos, os outros não merecem tanta indiferença como a que resulta do tratamento noticioso e do arrematar de estatísticas da competição. Se a tabela classificativa ocupa uma página inteira, só os peritos deitam o olhar a todos os concorrentes. A maioria interrompe a função no limiar onde se esgotam as medalhas. Abaixo do bronze, é como se os concorrentes deixassem de importar, ou nem tivessem participado na competição. É um equívoco, desvaloriza a façanha dos medalhados. 

Está por escrever a narrativa dos que enchem os números da competição, mas nem sonham em ostentar uma medalha ao pescoço. Estarão convencidos do lugar-comum segundo o qual o que interessa é participar? Numa competição desportiva, ganhar não deve fazer parte da ambição de todos os concorrentes? Ou muitos deles, contentando-se em obter os mínimos que dão acesso à competição, sentem como se tivessem conquistado a sua, pessoal, medalha? É esta a narrativa dos atletas que navegam nas catacumbas das classificações, apenas fazendo número para dilatar a glória que assiste aos vencedores? Alguém fica deprimido se ficar em último lugar?

Estes, os indiferentes que fazem número, acordam sabendo que se ficarem no trigésimo sexto lugar e se aproximarem do seu recorde pessoal é como regressar a casa com uma medalha imaterial para lembrar no futuro. Porque nem todos podem ganhar e a muitos compete, no máximo, engrossar um contingente. 

Sem saberem, dão o seu contributo para a glória dos vencedores. Essa é a sua parte da vitória.

Sem comentários: