LCD Soundsystem, “Call the
Police”, in https://www.youtube.com/watch?v=zWKIWNJnlzI
Aparentemente, prática corrente: as pessoas
aceitavam a oferta maior. E ele, enquanto fazia o tirocínio sobre as “normas de
boa convivência em sociedade” (que se esforçava por perceber a bondade,
aceitando-as acriticamente), dispensava os avisos de uns apoderados de uma
coisa nebulosa que os mesmos teimavam em chamar “moral”.
Os da sua laia, os que já tinham sido
instruendos das baias do tirocínio por que ele passava, e os outros que
coincidam na aprendizagem, levavam banhos de sabedoria sobre a forma contemporânea
de ser e de como o pragmatismo era imperativo. Normalmente, ambos os preceitos
acabavam por quadrar com o oportunismo. Era quando esbarravam de frente com os
meirinhos da ética: a estes, era deplorável a curvatura da espinha dorsal, de
tal maneira flexível que depressa se dizia uma coisa e o seu contrário, sem que
o seu contrário fosse reconhecido enquanto tal. E mesmo que fosse; que não se
tolerasse a intromissão de almas alheias nos meandros do pensamento próprio. Em
vez da intrusão dos autoproclamados juízes da ética, deviam estes começar por
olhar pelas suas entranhas – ou alguém se convencia que eram entidades de tal
modo perfeitas que ninguém lhes podia assacar pequenos pecadilhos que fossem? Em
jeito de auto congratulação pelos métodos modernos, os lentes desta prática
sussurravam, em comentário à possibilidade de corrupção dos arautos da ética,
sobre os telhados de vidro e o risco de ser o primeiro a atirar uma pedra.
Ponto da situação: os instrutores das “normas
de boa convivência em sociedade” (versão pragmática, adaptada às vicissitudes hodiernas)
terçavam argumentos uns a seguir aos outros para desvalorizar os predicamentos dos
autoproclamados juízes da ética. Seriam oportunistas ao jurarem que a ética
começa e acaba dentro de cada indivíduo – e sugere-se o oportunismo porque a
petição de princípio convinha para dissolver o sufrágio dos moicanos da
moralidade. De resto, os instruendos iam aprendendo: a decisão, quando tiver de
ser aferida, que se incline para os lados de quem faz a melhor oferta. E aprendiam
a calcular meticulosamente os prós e os contras das ofertas, pois nem sempre a
oferta mais aliciante correspondia à melhor oferta.
Anos mais tarde (mais de vinte), percebeu o equívoco.
Maldito tirocínio que lhe fornecera os esteios contaminados do pensamento. Talvez
estivesse errado ao longo deste tempo todo, ao dar prevalência a demandas que,
de outro modo, filtradas por um absoluto e objetivo juízo, seriam recusadas à
partida. Talvez ainda fosse a tempo. Não queria mudar o mundo, não podia ter
essa ambição. Tinha esses vinte e tal anos de ambígua probidade a arquear sobre
o corpo, curvando-o talvez sem redenção. Não era a remissão do pretérito que
queria obter. Era apenas a garantia que doravante tudo seria alinhavado pelas
costuras antípodas do que lhe fora ensinado. A soldo, apenas, do que viesse com
o clamor das veias.
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