27.11.17

Feira franca

Ultra Vivid Scene, “Special One”, in https://www.youtube.com/watch?v=1DCjSShu_VA    
Ao contrário do outro, envaidecido por se julgar ungido de certezas e de raramente se enganar, protesto: da franca feira de onde me situo, a galhardia da interrogação, o deleite das certezas que se esboroam na vidência das ideias frenéticas que esbarram de frente umas nas outras, a derrota das personagens tingidas pelo úbere das certezas sem contestação. Contra os próceres dos imperativos categóricos, uma franca feira onde o horizonte vem debruado com as cores variadas das ideias que com essas cores rimam. Pois se há certeza maior é a indisponibilidade da verdade, a não ser pelos estreitos corredores que correspondem a quem delas se diz tutor.
Dirão: mas o que voga no exterior, as impressões com o aval alheio, não contam para o arregimentar da verdade. Protesto, desde o pelourinho da feira franca: o que não interessa, é arregimentar a verdade. Servirá para a módica empreitada de firmar esteios que autorizam quem deles precisa a situar-se na imensidão do mundo. Mas talvez seja uma empreitada condenada ao fracasso: não podemos afunilar o olhar na pequenez da nossa existência, mesmo que seja reconhecida a tendência para aos demais não conferir a desusada importância que vem dos modismos vertidos pelas ciências.
Da feira franca sobeja o ar límpido, já não açambarcado pelas batutas hirsutas dos datados ínclitos que dão de beber a imperativos categóricos. Da feira franca colhem-se os mapas abertos, sem fronteiras por limite, sem o embaraço dos limites; é como se esses mapas contivessem páginas escondidas que vão sendo hasteadas à medida que o olhar se retira do tojo dos limites. Contra os apoderados das ideias à prova de bala, atirando-os (e às ideias assim contundentes) para a centrifugação de onde saem reduzidas a cinzas – para desaprenderem o topete da superioridade intelectual.
É este o pergaminho da feira franca: lugar sem trincheiras, onde as ideias transitam por cima das fronteiras ausentes, sem esbarrarem nas tábuas contrafeitas das ideias feitas e impecavelmente alinhadas. Pois dessas se diga, como sua descaução, que são as mais frágeis.

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