Faith No More, “Midlife
Crisis”, in https://www.youtube.com/watch?v=U8b88US-6ts
Estilística apurada: nada mais
importava, se não o estilo ostentado em cirúrgicas composições em que se tirava
partido da estética na sua dimensão demiúrgica. Que não se incomodassem os
varonis da desmemória com excruciantes convites para a poesia, ou para a
filosofia, ou para artes outras, ou ainda para coisas fendidas na sublimação do
pensamento: eram escamas pútridas que afeavam o ventre da estética – e tudo
parecia resumir-se à estética.
Ascetas em contramão argumentavam,
zelosamente, a favor da sublimação do pensamento e contra a vacuidade do estilo
pelo estilo. Os estetas não se convenciam. Estavam afogueados pelos detalhes do
estilo servido no dia, no dia após dia. Os outros que rasgassem o manto diáfano
do estilo, se ao estilo não se julgassem devedores. Que se entregassem no
alpendre onde amanhece o palco por onde desfilam interrogações hermenêuticas. Eles,
os apoderados pelo estilo, só se queriam entregar nas mãos da intangibilidade
do tempo. Pois julgavam-se imorredoiros, no exato contraste com a efemeridade
dos estilos que cavalgavam na onda volátil de modas em sequência vertiginosa.
Os ascetas, circunspetos, protestavam
contra a frivolidade dos apedeutas da mera estética. Acusavam-nos do crime
maior: o vazio de pensamento, a própria estética infundamentada – a não ser
pelos vapores do momento que congeminavam o selo fátuo de um estilo arvorado em
moda. Outros, menos circunspetos, divertiam-se com o pavor do estilo
impositivo. Não questionavam os arautos do estilo: era lá com eles, cultivarem
com denodo os sinais exteriores da interior inânia. Em vez de protestarem
contra os priores do estilo, protestavam contra os ascetas taciturnos. Se a sua
vontade fosse feita, os cuidadores do estilo deixariam de desfilar, com
incomensurável dano para o divertimento geral da casta.
Era uma guerra sem armas num triângulo
improvável: os ascetas carrancudos, os meditativos de espírito aliviado e os
promotores do estilo metódico. Só dois dos peões tinham consciência da peleja,
pois os cuidadores da estética, de tão empenhados na função, não davam conta do
que se passava fora dos limites do seu limitado cosmos. Tudo se resumia a uma
questão de estilo. Mesmo entre os ascetas de diferentes pergaminhos. Pois se
uns, atávicos e empedernidos, contestavam a soberba do estilo que não cuida de mais
nada, outros retorquiam, a seu favor, a necessidade de os priores do estilo
continuarem a ter lugar.
Uns e outros eram, talvez sem o saberem,
fautores de um estilo à sua maneira.
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