Que excentricidade admite que alguém se ponha na posição centrípeta de quem se arvora a um lugar especial e deixa para os demais um lugar subordinado? Será a inveja que os move quando olham para o lado e decretam que as pérolas foram dadas a porcos. O que querem dizer é que, para os seus padrões de bom-senso, a justiça não foi feita quando observam que alguém foi destinado a uma qualquer sinecura, concluindo que não há merecimento nessa atribuição. Por eito, deus costuma levar por tabela, com considerações avulsas sobre a distribuição (iníqua, desde o seu posto de observação) de nozes pelas vozes. É nestas alturas que deviam ter a noção de como a inveja é letal. É-o para quem bolça a inveja, pois os invejados só têm de a deixar sumir no altar da sua irrelevância. Dizem, os profissionais da inveja, que as pérolas são atiradas a porcos, ficando por saber por que os beneficiários arrostam a suína condição. Talvez faça sentido inverter o anátema e devolver às pérolas os porcos que nunca as terão – uma contradição de termos insanável, para eles perceberem que há coisas que não são para serem percebidas. Esses são os autênticos recos, que se enxurdam nas suas particulares pocilgas contaminadas pela cobiça. Não são eles as peças centrípetas do tabuleiro onde o jogo se joga. Esse é um erro de princípio: neste jogo não há credenciais diferentes, patentes como na tropa; todas as peças são iguais, mesmo quando ostentam o cisma da desigualdade. Que pergaminhos avalizam uns quantos a adejarem sobre os demais quando estes patenteiam uma condição que abona a inveja dos primeiros? O étimo da superioridade ostentada por uns é a caução do seu autêntico desprestígio. São os palradores natos que enchem a boca de verbos fátuos. Os primordiais suínos.
30.7.21
Porcos a pérolas (short stories #343)
David Bowie, “Ashes to Ashes” (live at Later on Jools Holland), in https://www.youtube.com/watch?v=WmiXjoknHDA
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