O medo era o rastilho que era preciso para derrotar o sedentarismo. Pessoas militantemente incapazes de darem um passo célere numa direção mudam de atitude quando sentem o medo a bafejar no pescoço. O medo é o remédio para fazer desabar os preconceitos. Dar corda aos sapatos é a única emenda quando o sedentarismo desafia a integridade física.
A ideia de dar corda aos sapatos é como naqueles relógios a que é preciso dar corda para não ficarem adormecidos na insolente marcha do tempo. Quem dá corda aos sapatos é, tal como a esses relógios, o usuário. As maravilhas de tecnologia inventaram relógios que dispensam o ritual de dar corda. Funcionam a pilhas. É preciso mudar a pilha quando atinge o prazo de validade. Também há sapatos que não precisam que se lhes dê corda? Esses sapatos substituem a vontade do usuário? Não e não, respetivamente. Os sapatos não andam sozinhos. São motorizados pela vontade de quem os calça.
Dar corda aos sapatos também é uma metáfora. É quando estamos imersos na indolência, ou quando precisamos de um abalo sísmico que mude a têmpera desde o magma, para acostarmos a um desiderato. Uma resolução a preceito é a ignição necessária. Só com a indulgência da resolução não se chegará ao desiderato. À medida que a inércia corresponde à medida do tempo, a resolução tende a ficar esquecida nos armários onde jazem as coisas destinadas a serem irrelevantes. Não será desse modo se dermos corda aos sapatos e nos convencermos que devemos dar seguimento à resolução. Para não ficarmos por boas intenções que nunca chegam ao pedestal do julgamento.
Damos corda aos sapatos porque não é bom olhado de nós dizerem que somos pusilânimes. Damos corda aos sapatos para eles voarem e com o seu voo nos levarem para os lugares de outro modo inacessíveis. Talvez fosse melhor dizer-se que damos corda às pernas, que não têm mediação.
Sem comentários:
Enviar um comentário