O dia seguir-se-á à noite – ou, o que não é de somenos importância, a noite será consecutiva do dia.
As estações serão quatro, por esta ordem: Outono, Inverno, Primavera e Verão (pondo o relógio a zero quando a escola começa um novo ano), a menos que o aquecimento global conspire contra esta angra de conservadorismo.
As pessoas hão de continuar a festejar o ano novo cheias de resoluções que juram, em bom jurar, que o neófito ano será a tradução de mudanças a esmo.
As escolas hão de continuar a ensinar (um módico). As universidades serão o santuário dos saberes arranjados na imensa enciclopédia popular (e aparentemente democrática) que é a internet – e os professores já não hão lamentar a sua irrelevância.
A música continuará na senda da reinvenção.
Os literatos serão dispensáveis (à mercê da democratização dos saberes que é mercê da internet).
O aquecimento global fará prova de vida e é provável que as estações se confundam umas nas outras, com tempestades estivais e estios invernais e Primaveras outonais e Outonos primaveris (ou a fusão da Primavera e do Outono).
Gurus irrepreensíveis emergirão para dar asilo aos descamisados de identidades, inaugurando uma nova arca epistolar que os extrai da orfandade.
As nações continuarão a ser o farol. As guerras, a sua consequência.
As armas e os arsenais não serão banidos.
Os pacifistas não deixarão de ser visionários sem tempo a preceito.
O abismo humano estará mais fundo, com a desconfiança a nortear as condutas e a antipatia boçal a bolçar por todo o lado, desmentindo os opúsculos homeostáticos que preconizam a utopia da cooperação.
Faltarão poucos cidadãos para lhes serem apostas comendas presidenciais por ocasião do dia de Camões e das comunidades.
As indústrias terão de ser verdes; o mundo será um condomínio de verde – se não, o aquecimento global será o nosso algoz (ou nós, ordenantes do aquecimento global, a confirmação da nossa própria autofagia).
As religiões continuarão a matar.
Políticos regentes, ensimesmados nas curtas vistas e no logro da demagogia, serão consumidos pela avareza e neles lavrará o caudal da corrupção.
As leis continuarão a ser ostensivamente desobedecidas e os delinquentes raras vezes descobertos e punidos.
Os países grandes continuarão a ser grandes e os pequenos, irrelevantes.
Os cavalos brancos não deixarão de parte a cor.
O mundo continuará a chamar-se Terra (antes que se enterre).
E o pior dos seus defeitos será a existência de oráculos.
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