Um dos maiores vícios do presente é querer saber como vai respirar o futuro. São oráculos em barda e uma coorte de historiadores do futuro. Afadigam-se, os adivinhadores do porvir, em destapar o véu do insondável. São dos maiores farsantes que por aí adejam. Eles e os ingénuos que são vítimas do logro, porque o futuro é apetecível e se o puderem saber de antemão, tanto melhor.
Podiam, os lídimos representantes da especialidade, pensar num museu do futuro. A clientela era garantida à partida, sinónimo de êxito económico e de proeza social (pois não calha nada mal instruir as massas sobre os acontecimentos futuros). No museu do futuro, cuidariam de o preencher com profecias várias, das irrisórias às mais ousadas, separadas por diferentes alas. O público seria conduzido, sucessivamente, da ala dos acontecimentos ainda incertos, mas com elevada probabilidade de serem testemunhados, para a ala dos eventos improváveis, mas só possíveis devido à inventividade dos promotores. Adivinha-se que o público demorar-se-ia na segunda ala, tão sedento de descobrir as cores do futuro.
Teria de ser um museu vivo: à medida que as profecias fossem desmentidas, a matéria a elas correspondente teria de ser retirada do museu – pois o futuro, em sua transubstanciação em tempo presente, encomendaria a negação dessas profecias. A ousadia dos promotores do museu recusaria a admissão de culpa pelas profecias obviamente não cumpridas. Quem ousa adivinhar o futuro não tem humildade para admitir que o futuro, quando se cumpriu, não lhes fez a vontade. Uma forma pós-estalinista de refazer a História – neste caso, a História do futuro, como os estalinistas se requintaram a desenhar a História do passado a regra e esquadro.
O museu do futuro seria a metáfora de uma impossibilidade. O futuro nunca está ao alcance das mãos quando se entretecem no momento possível que é o presente. Sempre que chegamos ao futuro, ele deixa de o ser. Os fazedores do museu do futuro, embebidos na demência dos oráculos sem chão, não têm o arcaboiço para o perceber. São a procrastinação de si mesmos. Não admira que vivam agarrados ao futuro como se fosse a sua tábua de salvação.
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