27.12.21

Sebastianismo ao alto

Damon Albarn, “The Universal” (live at the Jonathan Ross Show), in https://www.youtube.com/watch?v=OPijRGTKqsQ

Este é um lugar adiado por causa do mito sebastiânico. Prescrevemos a nossa incapacidade atrás do biombo de um messias que prometeu regressar numa manhã brumosa. Não veio, até hoje. E, contra a lógica e as probabilidades da durabilidade humana, continuamos à sua espera. Mesmo que tenha ultrapassado o seu prazo de validade.

Se não é a pessoa em causa, cuida-se de o transubstanciar noutra página do tempo. Episodicamente, emergem promessas de sebastiões. Não são sebastiões, ainda; ajuramentam-se como suas promessas, como se sua fosse a prova de vida e nosso o tirocínio às suas mãos. Até a ver, todos os sebastiões que se inscreveram em páginas da História não passaram de promessas de sebastiões. Mas não aprendemos. Saltamos de promessa de sebastião em promessa de sebastião. Enquanto saltitamos, anestesiando o presente, adia-se este lugar.

O pior dos dois mundos é quando o clamor popular pelo mais recente sebastião combina com o narcisismo potencial do prometido. Ao início, começa por ser apenas um esgar de narcisismo. À medida que o clamor popular se constitui em maré-alta, querendo transformar aquela promessa de sebastião em sebastião efetivo, a vaidade toma conta da personagem. Ainda bem. Assim cai a máscara da personagem e, de potencial sebastião, depressa se consome no estertor da sua ufania. Será dissolvido na indiferença dos mesmos que quase o endeusaram. 

A culpa é de um povo meão que parece desorientado na paisagem onde o seu desfado se confirma. Precisa de uma matriz que o coloque na senda de uma bússola. Precisa de um predestinado que se distinga da mediocridade. Engana-se no diagnóstico. Não há predestinados entre a gesta que se afirma num lugar. Somos todos sangue dessa mediania. Fingir que um de nós nos tirará do nanismo que passámos a ser, é uma farsa. É o palco certo para o adiamento imorredoiro de um lugar que não deixa de ser uma promessa por confirmar. 

O sebastianismo tentacular, matéria-prima da idiossincrasia do lugar, é como uma tatuagem que não se elide. É o esconderijo da incapacidade das várias gestas que testemunharam o definhar do lugar a que dizem pertencer. 

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