5.9.22

Ainda ninguém fez o inventário do número de autores (e das pessoas correspondentes) nos escaparates da feira do livro

dEUS, “Disappointed in the Sun” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=4QS2c7LpeJg

Quantos autores pertencem à feira do livro? Quantas são as pessoas que deram livros à estampa, entre vivos e mortos, acotoveladas nos expositores da feira do livro? Ouviu-se dizer: o inventário está por fazer.

Algumas dessas vidas são conhecidas: os autores famosos, personalidades cujas vidas saltaram para os néones. Aposte-se que a maioria dos nomes que dão a autoria a livros exibidos na feira só não são anónimos porque ganharam o direito a ostentar um ISBN à lapela do orgulho individual. Haverá alguém interessado em contribuir para a biografia das biografias da feira do livro? Podia ser uma obra coletiva que narrasse o lado banal de algumas dessas vidas. Ficariam à mercê do interesse do público. Não seria só uma feira do livro. Seria, talvez ainda mais, a feira do autor.

Dos autores cujas vidas são pouco mais do que anónimas, só sabemos os índices habituais de uma biografia minimalista: data e lugar de nascimento, outras obras publicadas, a profissão principal (se se der o caso de não serem escritores profissionais, que hoje já poucos ganham a vida a escrever), possivelmente quem os pôs no mundo. A instâncias das editoras, pode dar-se o caso de serem acrescentados uns pós à biografia do autor: ele tem a oportunidade de promover quem é, seja num registo solene (os autores que se levam muito a sério), seja num registo humorístico, ou num registo propositadamente auto-depreciativo (os autores que não chegam a perceber como houve uma editora que publicou o seu livro).

Se fossem compulsadas todas essas vidas, teríamos uma estatística avulsa: o número de licenciados, os que se casaram e, entre estes, os que depois se divorciaram, os que já foram ao Japão, ou à África do Sul, os que tiveram a ousadia de ler Petrarca (ou Aristóteles), os que sabem nadar, os que fumam, os que se curaram de qualquer forma de toxicodependência, os que são homossexuais (por hoje já mais interessa dar conta dos não binários), os que comem sempre um doce à sobremesa, os que detestam pijama, os que têm uma caligrafia ininteligível, os que são uma fraude autoinstituída (mas convenientemente disfarçada), os ateus e os hereges, os autores simplesmente lúdicos e os outros, insuportavelmente arcaicos, os que têm o vício do jogo (ou do álcool), os que só tomam banho às vezes.

Ou talvez não seja ideia a seguir. Para não fugirmos do que interessa e a feira não deixar de se chamar feira do livro.  

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