2.9.22

Oráculo do passado (ou: história do futuro virada do avesso)

Joan as Policy Woman, “Holy City”, in https://www.youtube.com/watch?v=zS5pjxseTQM

Recado aos patriarcas do futuro: convençam-se da frivolidade da vossa função. É o que do passado trazemos para memória futura. Os historiadores do futuro ainda não aprenderam que a contingência desaconselha a serem os feitores da presunção do futuro, pois adivinhar (mesmo que seja com base no pretérito) é um logro.

Ainda que fosse possível ter um oráculo virado para o futuro, a quem interessa saber as coordenadas desse tempo ainda ausente? O futuro está por fazer; antecipá-lo desaprova a sua linhagem, pois a ninguém são dados atributos para contemplar as variáveis, as certas e as indeterminadas, que são a pauta em que se compõe a posteridade. A quem interessa saber de que têmpera é feita o futuro, se a adivinhação ultrapassa o tempo por acontecer, destruindo-o na sua natureza? Ainda se houvesse druidas que apostam a carreira na categórica demonstração do futuro – mas os druidas pertencem à categoria dos unicórnios sem geografia. 

A empreitada de historiar o futuro não é convincente. Aposta-se na teoria das probabilidades, inventariada com o conhecimento da História (a tal que se repete como farsa, de acordo com um dos maiores farsantes do pensamento). Como se fosse possível extrair as bissetrizes do futuro pelo alinhamento dos acontecimentos herdados do passado – e todos os astros se congeminassem de forma a gerar acontecimentos vindouros. Servem-se do passado como oráculo para virarem do avesso a História do futuro. Não se iludam os enfeitiçados pelo advento desta impossibilidade. A função é uma patranha.

 As páginas do passado revelam-se na memória servida no periscópio do tempo. Usar o passado como ponte para o futuro é abusivo quando se distorce a linhagem do futuro, pretendendo dele reter na mão uma imagem de si fidedigna. Os usurários participam numa ilusão coletiva. Sem darem conta, falsificam o magma do tempo vindouro, convencidos que o poderão esculpir. Quando o futuro tem lugar, percebem o logro. Mas não aprendem.

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