As máquinas percutem a pedra, incessantemente. O ruído ecoa na boca, como se houvesse um esgrima por dentro do corpo e a carne sofresse repetidos abalos sísmicos. As pás remidas travam o vento contra a sua vontade. Mas é o vento que sobressai, como as pás fazem questão de ostentar. O corpo é uma pedreira inteira.
Como pode haver quem odeia a manhã?
Tomava a interrogação como mote. A manhã; a inauguração do dia (se descontada for a noite, que para efeitos cronológicos inicia um dia, mal atravessa o equinócio da meia-noite). Quem pode atirar insultos à manhã, só porque ela irrompeu e atirou lava para o sono interrompido? Mal sabem os que tardam em se libertar do amolecimento que a noite não é um deserto por onde apenas erram os boémios ou os que, à mercê de uma angústia órfã, tirocinam a insónia existencial. Talvez prefiram trocar de lugar com os que não usam a noite para dormir e a atravessam no lugar dos que fazem da noite jornada de trabalho.
É próprio do lugar-comum: muitos não estão satisfeitos com o que têm. Não chegam aos mínimos de lucidez para entender que o oposto amplifica o desconsolo.
Em vez de um surf mórbido nas páginas das notícias cheias de depressão, deviam encontrar as avenidas bucólicas onde as nuvens negras metafóricas não têm reservado direito de admissão. Em vez de cançonetas que não saem do ouvido, viciando as pessoas na iteração que exaure o sangue, deviam frequentar o teatro, recitar poesia ao deitar, dar ao sexo o que o sexo tem para dar, esconjurar as miragens que dissolvem o paradeiro.
Soubessem menosprezar as diligentes provocações, fingindo, a bom fingir, que habitam outra galáxia ou que as provocações vieram bater à porta errada (“mão morta, mão morta, vai bater àquela porta”). Soubessem não assinar no papel amarrotado onde se enquistam as almas beligerantes. Até serem mecenas de uma constelação nómada que inventaria os lugares mil, em vez de serem arrastados para uma maré forasteira.
Até dizerem, com o garbo de quem se sabe ileso às instigações, never mind.
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