5.6.23

A métrica dos exilados

The Fall, “There’s a Ghost in My House”, in https://www.youtube.com/watch?v=D0bZofM6EOU

Podia ser que houvesse furacões, na temporada dos furacões. Ou terramotos cíclicos, que a terra era fraca. Possivelmente, um vulcão adormecido, mas por adormecido estar era ameaça imorredoira. Podia ser que não houvesse cimento que juntasse ao lugar e ele soasse contraditório, um lugar de nascença mas sentido como forasteiro. Podia ser que não houvesse outra métrica que juntasse as almas ao registo do futuro, a não ser a métrica dos exilados.

O exílio podia ser uma escotilha que se abria sobre as esperanças fundamentadas. As esperanças apenas por antinomia: era como se o terreno exilado pudesse ser qualquer um, desde que não fosse o lugar paradoxalmente forasteiro. Conseguíamos arranjar um dicionário que fosse o passaporte para o lugar exilado. E depois, sem juras de identidade, o exílio – há que não o esquecer – seria a festa desejada para celebrar a liberdade de ser, já não dependente da musculada pertença.

Podia haver diferentes métricas, correspondendo a diferentes exílios. Seria como demandar diferentes lugares, e nós procuradores de uma cosmopolita identidade que se sobrepunha às fronteiras que destinam todos os lugares à exiguidade (por maiores que sejam). Recusando o nomadismo que apequena, depois de levantar as sucessivas camadas de véus que se abatem, silenciosos, sobre o corpo hibernado. 

O exílio não seria a recusa do lugar de pertença estranhamente forasteiro. Seria a convocatória de outros lugares, como se a sua demanda participasse na maioridade da alma. Nem que este fosse um fingimento mal encenado: se fosse preciso, o convencimento interior do exílio não como uma evocação destrutiva, contra um lugar que perdeu as margens da identidade; mas como a procura pelo avesso das fronteiras, até que os lugares por demandar congeminassem uma pertença múltipla e sem as algemas da identidade.

Chegava uma altura em que as interrogações esbarravam, incessantes, no peito ferido. E nós, que não capitulamos às anestesias que nos servilizam e condenam à subserviência, inseminamos o exílio como resposta. Procuramos outros palcos, que sejam o fértil mecenato que resgata da decadência ajuramentada.

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