A partida reavia os prantos demorados. As almas separadas não sabiam se conseguiam amputar o ónus da distância. Faziam juras. Olhavam fixamente nos olhos recíprocos como se a convicção dos olhares semeasse as juras amanhecidas. Diziam, em sussurro, que o tempo mais tarde os resgataria da distância. Mesmo que não soubessem quando seria esse futuro.
Partiam sem saber se o futuro se conseguia. Para não perdoarem o esquecimento, emolduraram as juras: a palavra era a assinatura de sangue de que precisavam. Até saberem que dispensavam as juras. Elas eram metáfora que sossegava as almas apoquentadas. Diziam: vamos falar todos os dias, nem que seja só um minuto. Haverá dias em que vamos falar dez, vinte, trinta minutos: precisamos de um diário de bordo, atravessar as tuas palavras na minha carne, como se continuássemos a ser do corpo outro só através das palavras que matam a distância.
Juraram que não seriam procuradores da saudade. Não importava a melancolia se dela soubessem não ser redenção. Ele levava na carteira uma fotografia dela a corpo inteiro. Ela manteria espalhado pela casa o espólio que retrata a construção da felicidade, ele sempre por perto, um rosto presente. Do outro lado do mundo, ele será o seu embaixador. Quando for a lugares novos, os seus olhos serão o seu guia, como se ela estivesse ali mesmo ao seu lado. E nem os díspares fusos horários serão revés para continuarem a ser presentes no meio de tanta ausência que é feita da distância imposta por um mundo que é sempre grande de mais.
Num último volteio de saudades que juraram rebater, ele prometeu que vai trepar no corrimão da vida para a vir buscar. Ela hesitou, subitamente tomada pelo medo. “Eu nunca saí daqui, não sei se consigo, tenho medo.” Ele sossegou-a: “em mim terás a âncora necessária, o esteio que te fará esquecer de onde vens, só contará saberes que estás comigo, não onde estás. Se quiseres, serei o teu cicerone, a bandeira que hasteias. Os lugares em que estivermos serão sempre a nossa casa.”
A voz silabada penetrou-a como um bálsamo. A angústia em que instantaneamente caiu dissolveu-se no perímetro da saudade daquele futuro prometido. Ela não sabia se algum dia seria o vitral daquela promessa. Ao menos, a despedida já não era uma amputação.
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