Explosions in the Sky, “Moving On”, in https://www.youtube.com/watch?v=jTv8-DWWW3I
Somos párias (dizem) se formos indiferentes ao meio e nenhum for o pronunciamento sobre o estado da cidade. Somos acusados de apatia se o rosto estiver alinhado com outra bússola e os lugares onde temos presença forem apenas lugares, materializados por pessoas que os desfiguram. A indiferença, de acordo com este imperativo categórico de participação, deve ser retratada.
E se a nosso favor invocarmos o largo tempo de desagrado pela governação da cidade? E se olharmos em redor e os que se propõem dar continuidade ou escolher mudança não forem confiáveis pela fraca linhagem que ostentam? Devemos interromper a indiferença para escolher um mal menor? A participação nivelada pelo menor denominador comum safa-nos da acusação de indiferença? E que contas prestamos à consciência? Deve a consciência inclinar-se perante o dever de não alienação? E se a indiferença for um luto sem forma típica, um período de nojo pelas adversidades que também atingem os indiferentes?
O dever a ser gregário continua a comandar os mandamentos. É por eles que se seguem os comportamentos aceitáveis. Os que descaem para laivos de indiferença são chamados à razão, instados a resgatar os laços de pertença para não serem contaminados pela indiferença, que depois avança sem ser possível rasgá-la. Os que já estão imersos na indiferença são casos perdidos. O resgate de indiferentes para o tabuleiro da cidadania benigna não costuma acontecer. São os intérpretes da cidadania maligna pela demissão da cidadania.
Os argumentos podiam ser virados do avesso. Os indiferentes convocam a seu favor o direito de serem quem são sem intrusão dos outros, convocando um dever de reciprocidade: eles não se importam com o que os outros pensam, não fazem juízos de valor das escolhas dos que participam na cidadania benigna. Na lógica da indiferença assenta o não pactuar com a imperícia, o arrivismo, o discurso vazio e todavia gongórico (“engana-me com palavras”), o exercício do poder enquanto finalidade, o sistemático passo em falso quando assinam diagnósticos e apresentam prescrições. Através da indiferença, recusa-se essa corresponsabilidade.
O estamento dos indiferentes não é uma coutada de párias. A indiferença é o somatório da observação cuidada do passado e a caução para a indiferença do presente. Os indiferentes não devem ser condenados: o que se costuma dizer de quem sofre na carne as duras penas que o consome e repete a dose na primeira ocasião disponível?
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