Curve, “Fait Accompli”, in https://www.youtube.com/watch?v=Q9Plourz3Xs
À sorte dedica-se a trégua. Os olhos não se querem consumidos pela irradiação que os adultera. Não são as vítimas inocentes que se resguardam de injustiças, quase sempre atrozes. Somos todos, hoje fora desse perímetro, mas incógnitas perante o tempo ausente.
Se apenas fossem sufragadas as sílabas serenas que compõem frases à prova de convulsões, seríamos poemas em forma de pessoa. Não devíamos nada aos medos, não teríamos de espreitar para trás hipotecados pelas investidas de vultos perenes. Como prova de desembaraço, convocaríamos a beleza inteira das palavras como modo de estar, deixando atuar a doçura das sílabas arrancadas com a diligência de quem sabe ter gentis gestos no trato. Não desconfiamos das metáforas se elas não forem espelhos baços de desvirtudes. Chamamos os nomes inteiros sem represálias e os dedos sondam os destroços que são o inventário do passado.
Não são os relógios que medem o tempo, é uma cortina de espelhos que reverbera as palavras ditas, angariadas na espuma da memória que não se rende. Às vezes são memórias ardilosas, prolongam momentos que pertencem ao inventário das memórias em crédito; mas hipotecam o tempo passado a resgatá-las da sua coutada. Outras vezes, talvez por uma qualquer torpeza de espírito, a memória atraiçoa flagrantemente o seu espírito: são as recordações desbotadas que, todavia, se avivam como se assentassem em carne viva, deixando feridas à mostra. As tréguas são interrompidas.
O tremor do passado pode ser um poema daninho. Não se propõe que o pretérito seja adulterado para dissolver da memória os daninhos instantes, mesmo que venham em forma de poesia. O tempo não se apaga. Podemos condená-lo ao esquecimento, se aos fragmentos daninhos regressarmos e os quisermos anulados. Se a memória se entregar a um jogo, que seja benigno.
Até os melhores poetas ganharam fama à custa de estrofes daninhas. Não devemos nada ao medo se à superfície assomarem poemas daninhos.
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