Ty Segall and the Muggers, “Squealer”
(live on KEXP), in https://www.youtube.com/watch?v=MvEE0FLRNHg
Não sou de começar uma frase dizendo “dantes é que era” (e depois completá-la
a preceito para provar que as coisas agora, no domínio sob escrutínio, não se
comparam às adversidades de outrora e que, portanto, dantes é que se podia
falar de proezas e agora é tudo gente tenra).
Quando passam pelos olhos imagens de pescadores
servidos por tecnologia de ponta à cata de bancos de peixe, como se a
tecnologia fosse um íman que ordena os pesqueiros a seguirem na direção de onde
se discernem os bancos de peixe, é de trapaça que se fala. Não é para aqui chamada
a retórica ecológica – não que possa ser menosprezada; para o caso e para o
argumento que se expõe, não tem cabimento. Dantes, os pescadores tinham de
seguir o instinto, lançando as redes ao calhas, lançando as canas de pesca
aleatoriamente, à espera que ao isco adviesse um peixe, à espera que ao fundo
das redes se prendessem numerosos peixes e a faina estivesse feita. Agora é
diferente. Liga-se a maquineta, um sonar com a mais evoluída tecnologia, e os
peixes, se os houver nas imediações, são sinalizados. É só virar o leme da
embarcação, apontá-la às coordenadas denunciadas pelo aparato tecnológico. É tudo
fácil. Mas, afinal, não é esse o propósito da tecnologia (facilitar as funções
que temos entre mãos)?
Sobra ainda a parte mais difícil da empreitada,
sobretudo quando a pesca é grossa e se exige força de braço para vencer pelo
cansaço as presas de mais de cem quilos que se debatem, furiosamente, como quem
adivinha que esse combate é a fina linha divisória entre sobrevivência e óbito.
Se a luta com o peixe ferido de morte tiver vencimento para o lado do pescador,
é ainda preciso força braçal para içar a presa a bordo.
De volta ao método de indagação dos bancos de
pesca: é como o jogador que tem a confortável tarefa de intuir os números na
penumbra, afinal não jogando no escuro, mas com algum conhecimento de causa,
dissolvendo o risco e tendo a certeza do resultado favorável. Ou do espetador
de uma peça de teatro que sabe, antes de a peça começar, o seu epílogo. Ou dos
pleitos desportivos em que é sabido o resultado ainda os competidores não foram
a jogo. São manhas que transfiguram a função. A luta ganha foros de desigualdade.
É a legitimação da batota, que perde a carga negativa da palavra por ela deixar
de ser usada nos termos em que depreciativamente o é quando alguém coloca
outrem no banco da censura.
Consta que é maleita que se itera. Num juízo
bondoso, dir-se-ia que a impaciência incendeia o limite da trapaça. Os que
forem menos condescendentes, caem no logro do juízo moral. É melhor recusarem,
não vá um mais tardio boomerang despenhar-se sobre eles.
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