Sujam as mãos na húbris levitada numa alvorada que julgam a preceito. Serem o centro do mundo é o fado irrenunciável que inscrevem no roteiro que chamam às suas mãos. E, todavia, não há campos claros que motivem um tributo, a não ser a alucinação que medra por dentro do arremedo em que se constituem.
Acostumados às trincheiras que delimitam a simplicidade excessiva (que, porém, não reproduz o mundo às suas ilhargas), promovem acantonamentos. São os demais contra eles, justamente porque não estão na sua trincheira. Não ajuízam a hipótese de neutralidade. Não aceitam a dissidência, nem que os dissidentes encontrem razões para se situarem na dissidência. Sentem-se constantemente acossados. Se não estiverem acossados, a mobilização esgota-se numa ausência de motivo. São como são por serem contra os que não estão com eles. Tudo se encerra na órbitra do radicalismo. Tudo é levado às extremas. E quanto maior for a desidentificação dos outros, mais são empurrados para a falésia de que eles, por denunciarem a conspiração da desidentificação, são os únicos não habitantes. É um lugar dividido entre os puros (eles) e os impuros.
Por isso entregam nas mãos dos outros um lema distintivo: é pegar ou largar. Não há meio-termo. Em sua defesa, ufanam-se de serem zeladores da coerência à prova de bala – e repetem: não há meios-termos, só há termos inteiros, palavras de corpo único, irrefutáveis, ainda que seja preciso banir a memória ou selecionar a absolvição por intermédio do formalismo da justiça. Mas a justiça não é composta apenas pelas sentenças dos tribunais. Existe um sentido inato de justiça, o sentido comum apurado pelos que assumem a cidadania e interpretam a justiça para além das peias do formalismo.
E se nos dizem “é pegar ou largar”, temos o direito de largar de mão e deixá-los sós a lutar contra moinhos de vento. Pois se não fossem os moinhos de vento, eram órfãos. Apegam-se aos demónios que perenemente conspiram contra a sua causa, porque na ausência desses demónios as causas em favor das quais esgrimem armas seriam dissolvidas. Os que os largam de mão, abjurados, sitiados num canto que vira a geografia do avesso (pois se alguém se remete a um canto são eles, fautores desse isolamento), não andam longe da personificação dos demónios que os acossam.
É um mundo pequenino, aprisionado num labirinto de mesquinhez, habitado por gente por sua vez habitada por fantasmas imorredoiros. Quem não se liberta dos fantasmas que os ocupa, dificilmente chega a ser gente em sentido próprio.
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